domingo, 14 de setembro de 2014

MINHA PRIMEIRA VIAGEM AOS ESTADOS UNIDOS (PARTE 1)

Já fiz várias viagens para os Estados Unidos, mas aqui eu vou falar em especial da primeira delas. Parece que foi ontem, mas tudo aconteceu no início de 1986, ocasião em que viajavam para o “estrangeiro” somente pessoas de alto poder aquisitivo. Eu era pobre, mas tinha o principal: a fé em Deus. Sempre acreditei que com aquela fé e a minha perseverança eu venceria as barreiras financeiras e conseguiria realizar o meu grande sonho de  conhecer a “América”.

Pois é, certo dia eu conversava com meu amigo Charles Lage, que na época era meu chefe no Othon Palace Hotel, em Belo Horizonte e ele me sugeriu: “Ferrão, *sapeca esse carro nos cobres e vai pros Estados Unidos.” Com muita dificuldade eu tinha comprado o meu primeiro carro, uma Brasília com cinco anos de uso. Naquele momento eu fiquei empolgado e comecei a pensar na possibilidade de viajar, entretanto, faltava-me o principal e mais importante, o visto americano. Naquela época não se conseguia um visto como hoje! Segundo as estatísticas, apenas 5% das pessoas que iam ao consulado americano conseguiam o carimbo no passaporte. 

Bom, eu não tinha nem o comprovante de imposto de renda que era um dos requisitos principais para se conseguir o visto. Mesmo assim, com a fé em Deus, parti para o Rio de Janeiro para a tão temida entrevista. Com apenas 22 anos, sem nenhuma referência de viagens anteriores e apenas com a minha carteira de trabalho em mãos enfrentei aquela americana de “cara amarrada”, mas que foi muito simpática durante a entrevista. 

O resultado daquela conversa foi o prêmio mais valioso que um jovem pobre do interior mineiro poderia receber. O visto americano válido para quatro anos!

Apenas 15 dias depois eu embarquei para Miami. Ah, não pensem que foi um voo direto BH/Miami! Naquele tempo o Aeroporto de Confins era recém-inaugurado e ainda não existiam voos diretos para os Estados Unidos. Viajei de ônibus de Belo Horizonte para São Paulo e ali embarquei em uma “sucata” das Linhas Aéreas Paraguaias e, depois de uma rápida escala em Asunción, parti rumo a Miami.

Desde aquela época eu já era muito comunicativo e tratei logo de começar uma conversa com o Sr José Silva, passageiro de Porto Alegre que sentava ao meu lado. Durante a viagem notei que ele também estava ansioso como eu. Ambos estávamos preocupados com a chegada em Miami, afinal, chegaríamos de madrugada e não tínhamos reserva em hotel. Eu tinha uma pequena vantagem por falar um pouquinho de inglês. Isso faria uma grande diferença ao desembarcarmos. O meu destino final seria Miami, mas o Sr José apenas dormiria lá para seguir viagem no dia seguinte para a Carolina do Norte onde residia um irmão dele.

Após passarmos pelo serviço de imigração nos dirigimos para a área externa do aeroporto onde decidiríamos para onde ir. Eu tinha sido alertado de que havia um serviço de transporte mais barato denominado “shuttle service”. Como eu era um turista “pobre”, tinha que começar a economizar logo na chegada. Procurei um motorista desse serviço e ele se prontificou a nos levar para Miami Beach, entretanto já foi logo avisando que seria difícil conseguir um hotel com preço módico devido ser alta temporada na cidade.

O motorista parou num hotelzinho chamado Surrey na avenida Collins . Foi até a recepção para saber se havia disponibilidade e voltou dizendo que seria possível nós ficarmos lá e ele mesmo sugeriu que ficássemos no mesmo quarto, uma vez que o preço era o mesmo, tanto para uma ou para duas pessoas. Depois de uma longa e cansativa viagem, nada melhor que um coxilo numa cama bem confortável!

No dia seguinte nós nos despedimos e o Sr José seguiu sua viagem. Eu continuei hospedado no tal hotel até me ambientar com a cidade, pois ali eu ainda ficaria por algum tempo. (...)

*(sapeca esse carro nos cobres = venda esse carro)


sexta-feira, 12 de setembro de 2014

UM SIMPLES MINEIRO NA CHINA


Foi em 1999. Eu estava desempregado e resolvi ir ao centro de Belo Horizonte para esquecer um pouco os problemas. Era um domingo. Pensei em comprar um jornal para verificar o caderno de classificados em busca de um trabalho. Ao conferir meu dinheiro, notei que não era suficiente para comprar o jornal e pagar a passagem do ônibus de volta. Cheguei a pensar: Deus pode fazer com que eu encontre um jornal na rua. Acabei me esquecendo daquilo e continuei andando.

Em um dado momento, quase na esquina da Rua Curitiba com Tamoios, olhei para o chão e vi um jornal todo bagunçado na calçada. Pensei em pegá-lo, mas ao mesmo tempo passou pela minha cabeça que ninguém jogaria fora um jornal novo. Resolvi então pegá-lo e, após constatar que era um jornal daquele dia, fui direto aos classificados. Circulei dois dos vários anúncios que me interessaram e fui para casa. Na segunda feira bem cedo, tratei de me arrumar e fui em busca do trabalho que eu tanto precisava.

A primeira empresa era um grande hotel, famoso pela má administração do seu proprietário. Ali chegando, fui direto ao departamento de pessoal. Após uma breve entrevista, a filha do dono do hotel me pediu que a aguardasse enquanto ela conversaria com o pai. Minutos depois ela voltou sorrindo e disse: “você é o nosso mais novo gerente comercial”. Meio sem entender, combinei que começaria no dia seguinte e sai pensativo. Lembrei-me que eu havia circulado outra empresa no jornal e resolvi dar uma passadinha lá também.

Ao ver uma enorme fila no local ocupei o último lugar. Minutos depois surgiu um chinês que me perguntou se eu falava inglês. Ao responder que sim, fui convidado a entrar. Depois de uma longa conversa em inglês o tal chinês me pediu para voltar na manhã seguinte, pois a empresária, dona da loja que abriria as portas naquele local, era sua tia, e a palavra final sobre a contratação seria dela.

Para minha surpresa, ao chegar lá na terça feira havia uma chinesa na porta. Ela sorriu para mim e disse que eu estava contratado como gerente da sua loja. Tratei logo de ligar para o hotel e dispensei a vaga que me fora oferecida.

Na mesma semana fomos para São Paulo onde permanecemos por mais de 15 dias. Como os chineses tinham um amigo na capital paulista, resolveram ficar na casa dele e me hospedaram em um hotel com todas as despesas por conta da empresa. Poucos dias após voltarmos de São Paulo, inauguramos a loja.

Em uma certa tarde, dois meses depois da inauguração, a chinesa me fez uma pergunta que eu cheguei a pensar que estava sonhando! “Você gostaria de conhecer a China?" Eu, meio sem entender a pergunta, respondi: eu jamais teria condição financeira para fazer uma viagem como essa! Ela me olhou sorrindo e disse: “Não perguntei se você teria condição de pagar. Estou perguntando se você quer viajar para a China comigo”.

Quando notei que não era um sonho e que eu realmente teria a oportunidade conhecer uma cultura tão diferente da nossa, acertamos a data da viagem. Como ela precisava resolver negócios na África do Sul, viajou primeiro e tratamos de nos encontrar uma semana depois, em Joanesburgo, capital sul-africana. Ali permanecemos por alguns dias viajando por várias cidades. Outras pessoas da família chinesa viajavam conosco.

Depois de conhecer lugares que eu jamais imaginara chegou o dia de embarcarmos para a China. Nossa primeira escala foi em Hong Kong. Uma cidade extremamente bela! Seu aeroporto internacional foi construído na orla marítima e tinha acabado de ser inaugurado. Dali tomamos outro avião rumo a Shangai, nosso destino final.

Os dias que ali passamos foram para mim dias de contentamento. Visitamos os principais pontos turísticos da cidade. Aonde íamos eu me sentia uma celebridade, afinal, todo mundo naquela cidade mexia comigo. Isso foi fantástico!

Na volta passei novamente em Joanesburgo onde fiquei por mais três dias. Ainda no aeroporto daquela cidade, momentos antes do meu embarque de volta ao Brasil, comecei a sentir-me mal, indo parar em um posto médico ali mesmo. Em uma cadeira de rodas fui levado até ao avião.

Ao chegar aqui meu estado de saúde se agravou e acabei internado por 20 dias, descobrindo, mais tarde, que eu estava com tuberculose. Passei por um longo tratamento e venci. Hoje não apresento nenhuma sequela da doença e guardo comigo eternas recordações de um sonho que eu vivi acordado.

Você que está lendo esse depoimento e deseja realizar um sonho, ainda que impossível, nunca desista! Um dia, quando você menos esperar, a sorte baterá em sua porta, assim como ela bateu na minha e me fez muito feliz!